Na Luta pela Escola Pública

Este blog pretende criar um espaço para informações e discussões sobre Escola Pública na Região dos Lagos, com destaque para o município de Cabo Frio.

O nome “Pó de Giz” é tomado, por empréstimo, do antigo time de futebol dos professores do Colégio Municipal Rui Barbosa. Um colégio reconhecido por sua luta pela educação pública de qualidade. Um lugar onde fervilha a discussão educacional, política e social. Colégio que contribui de maneira significativa na formação de seus alunos, lugar onde se trabalha com o sentido do coletivo.

O " Pó de Giz" é uma singela homenagem a essa escola que tem um "pequeno" espaço educacional, mas corajoso e enorme lugar de formação cidadã.


quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Reflexões sobre a GREVE - RJ 2011

Participar de uma greve que durou 66 dias é uma experiência única e que deve ser vivida por todos, pelo menos uma vez na vida. É cansativa, é estressante e nem sempre se consegue ver todas as reivindicações atendidas, mas é um aprendizado enriquecedor, uma oportunidade de vivenciar a união, a solidariedade e a força que propocionada pela união. É uma pena que a sociedade não tenha consciência dessa força e também não é mera coincidência a campanha do sistema para evitar, a todo custo, essa descoberta.

O que me leva a ser uma grevista? É a consciência que tenho de que somos uma espécie coletiva. Nós humanos não somos ilhas isoladas, como tenta o sistema nos fazer crer. Toda a natureza é um sistema coletivo, a força e o equilíbrio estão na a união e a debilidade e o desequilíbrio é provocado pelo isolamento. Antes de continuar a leitura, pare e analise a imagem que ilustra esse post! Entendeu?

A união é a chave para a sobrevivência e esta é uma lei imutável da criação, somente o ser humano, iludido pelo egoísmo insiste em ignorar essa lei, pagando com o sofrimento e a miséria a sua teimosia. Observe que a maioria dos animais vive em bandos porque é ali que está a segurança, a força e a chave da sobrevivência. Um animal sob a proteção do bando não é uma presa fácil, a primeira ação do predador e separá-lo do bando para poder dominá-lo, caso contrário não terá êxito. Sem o bando, as aves migratórias jamais conseguiriam fazer as viagens transcontinentais, pois uma ave sozinha não tema forças para quebrar a resistência do vento por muito tempo, e só o revezamento as permitem voar do Alasca até a Patagônia e retornar à origem todos os anos. Uma abelha sozinha, não consegue colher o pólen e transformá-lo em mel, mas várias abelhas trabalhando em conjunto conseguem realizar essa tarefa. Uma árvore isolada não resiste à tempestade, entretanto para uma floresta a tempestade se transforma em alimento fortalecendo-a e revitalizando. Os exemplos, dados pela natureza são inúmeros e também a história dos seres humanos está cheia de exemplos que provam que a união gera a força e garante a sobrevivência da espécie.

Hoje, não temos mais que enfrentar tigres-dente-de-sabre ou correr em grupo atrás da caça para nos alimentar, mas continuamos ameaçados por grupos de nossa própria espécie cegos pela ambição, pela ganância e pela manutenção do poder, e como as feras do passado ameaçam a nossa sobrevivência, por isso a união continua sendo uma necessidade .

A subversão da lei da união esteve presente em falas correntes muito usadas pelos não-grevistas: “só paro se a maioria parar”, e também por grevistas decepcionados: "eu parei, mas pouco vai adiantar porque os outros continuam nas salas". Taticamente não-grevistas e grevistas, reconhecem a força da união, entretanto ambos estão equivocados em suas colocações por não terem compreendido que o coletivo é uma construção que depende da vontade individual de se unir, caso contrário ele não será formado. O coletivo surge a partir da vontade individual, logo a decisão tem que: EU VOU PARAR E ADERIR Á GREVE, pois é o tipo de ação que não pode ficar na dependência da decisão do outro, porque ela se refere à minha proteção e a minha sobrevivência individual, logo é uma ação pessoal e intransferível, que não pode nem deve depender dos outros.

Antes da greve, formulei as seguintes questões:

*
Estou satisfeita com a situação?
*
Estou sendo respeitada?
*
Meu trabalho está sendo valorizado?
*
Devo me submeter e não tentar lutar para mudar a minha realidade e resolver os meus problemas?
*
Estou de acordo com a política educacional adotada?
*
Acredito que estou oferecendo aos meus alunos uma educação de qualidade?
*
Como cidadã, devo deixar de defender os meus direitos?
*
Quero compactuar com as autoridades e tratar a educação pública com descaso que vem sendo demonstrado?
*
Concordo que as classes menos favorecidas não devem ter acesso a uma educação de qualidade?
*
O que quero com o meu trabalho? Condenar o estudante da rede publica, por falta de opção a ser mão-de-obra barata para perpetuar a miséria e a dependência que sustenta a desigualdade social?
*
Como cidadã, estou satisfeita com o destino dos meus impostos?
*
Como eleitora estou satisfeita com a atuação dos políticos?


NÃO, foi a resposta a todas as questões formuladas acima, e não tive dúvidas em aderir à greve. Não parei para pensar se meus colegas iriam parar, se as escolas do interior iriam aderir à paralisação, ou se a direção das escolas em que trabalho e os colegas não iriam compreender.

Segui apenas a minha consciência, pois depois de responder NÃO à todas essas questões e permanecer de braços cruzados, eu estaria me violentando, me prostituindo e permitindo que o sistema prejudicasse também o meu emocional, roubando a minha dignidade e a minha paz de espírito. É ilógico a vítima se tornar cúmplice dos seus algozes, caso isso aconteça é um sinal claro de distúrbio mental e uma pessoa nestas condições deve, imediatamente, buscar auxílio médico, pois sua sanidade está em perigo. Em suma, tomei a decisão de buscar a união para me fortalecer e garantir a minha sobrevivência. Sou e estou em coletivo, pois instintivamente é essa a natureza humana, fomos criados e programados para viver e agir juntos, disso depende a sobrevivência da espécie.

Voltei ontem, ao trabalho e vou ter que repor as aulas até o dia 19 de novembro, porque dou aulas em duas escolas e a única maneira de fazer a reposição, marcada para o mesmo dia da semana e o mesmo horário, será alternando entre as duas escolas. Farei com o maior prazer e não me importaria em não ter as férias de janeiro, pois a consciência tranqüila e a minha autoestima em alta não deixam espaço para o cansaço e a má vontade. Dar aulas é um prazer, o tempo em sala é mágico e não tenho a menor dúvida em continuar no magistério. Quero continuar fazendo o que gosto, quero continuar defendendo os valores que acredito e vou lutar até o fim para mudar o que está errado, sair nem pensar.

Tenho fé na educação, acredito piamente que uma educação pública de qualidade é a revolução que vai mudar essa nação e só a morte vai me fazer desistir desse projeto. As péssimas condições de trabalho, a desvalorização profissional, a alienação dos alunos e da categoria e a baixa qualidade da educação são frentes de batalhas que devem ser vencidas e tornam a minha presença obrigatória dentro deste campo de batalha. Para aqueles que acreditam, só existe uma opção que é ficar e enfrentar os obstáculos. Desistir é fazer o jogo do sistema, e se nós professores abandonarmos a luta que vai modificar esse cenário?

Calma, D.Quixote não é o meu modelo, tenho plena consciencia que essa luta não pode ser vencida só com a força dos professores! Concordo com a Amanda Gurgel: não dá salvar a nação com um toco de giz ou um pincel atômico descarregado! Mas sobrou para nós a terefa de ser o agente catalizador dessa ação, somos o fermento para levedar a massa e fazê-la crescer temos que trabalhar para mobilizar os demais segmentos da sociedade. Somos nós a brasinha sob a cinza!

A votação na ALERJ, em 11 e agosto, nos provou que a maioria dos políticos não tem nenhum compromisso com uma educação pública de qualidade, essa preocupação se limita ao discurso demagógico em temporada de campanha. O aumento que nos foi concedido mostrou o quanto vale para o governador e para a maioria dos deputados da Alerj, a educação do aluno da escola pública. Se dividirmos esse aumento pelo número de aulas e pelo número de alunos que temos, cada aluno vale míseros centavos , pois é mais lucrativo investir na repressão ao crime do que em educação.

A questão social continua, em pleno século XXI, a ser caso de polícia. Caverões, viaturas, armamentos pesados, BOPE e presídios são mais importantes do o salário de um professor, a quentinha do presidiário mais importante do que a merenda do estudante. O crime compesa mais em lucros do que a educação. O confronto REPRESSÃO X EDUCAÇÃO, evidencia que para as nossas autoridades pobre bom é aquele que é miserável, está preso ou está morto! Educação para erradicar a miséria? Nunca, pois dar autonomia aos pobres é extinguir a linha de montagem do voto que garante o poder da elite tacanha e corrupta desse país desde os tempos coloniais.

Portanto, os baixos salários do magistéiro são um reflexo da desvalorização da educação, é efeito e não causa, portanto para reverter essa situação é preciso atacar a causa, enquanto ficarmos combatendo só os efeitos os problemas vão continuar, o foco da luta tem que ser redirecionado. Essa conclusão é mais um legado dessa greve de 2011, que deve ser aprofundado e valorizado pela categoria.

Como toda luta, essa greve também deixou cicatrizes e feridas abertas no corpo da categoria, mas temos que cura-las e não deixá-las serem tomadas pela infecção.

Uma ferida aberta que considero perigosa, é a decepção com o sindicato que marcou muitos grevistas. A maneira como a greve foi encerrada e não suspensa, pois a expressão utilizada foi "fim da greve" durante a assembléia, foi em termos estratégicos, um desastre. Entretanto temos que ser racionais e não confundir o transitório com o permanente, isto é a instituição (o sindicato) com a diretoria.

Muitos saíram do Clube Municipal com a impressão de que a votação foi manipulada, pois cabia à mesa diretora ter adotado uma posição de neutralidade que não foi observada. Na fala de abertura o discurso foi feito com verbos no passado (rememorem a primeira fala do Danilo), essa foi uma atitude errada, pois somente após a votação pelo plenário decretando o fim da greve a mesa poderia adotar esse tempo verbal. Entretanto a confusão continuou aumentar: os informes foram dados atabalhoadamente; abriram espaço para a fala de um ambientalista falar sobre as ameaças ao ecossistema da baia de Sepetiba, ameaçado pelos submarinos nucleares, coisa que não tinha nada a ver naquele momento; a votação para as falas foi feita em um momento de dispersão do plenário; não foi feita uma avaliação do movimento apresentando evidências que o movimento estivesse perdendo forças; e o mais estranho, a mesma diretoria que repudiou os 3,5% de reajuste fez um discurso de vitória em relação aos 5% e em nenhum momento fez uma monção de repúdio à atitude covarde dos deputados da Alerj, toda a fala nervosa da diretoria, já considerava, antes da votação, a greve terminada; iniciada a defesa, em falas alternadas, da continuação ou do termino da greve, vimos a diretoria do SEPE se colocar em peso defendendo o final, chegando ao ponto de alegar a ameaça de crise econômica que sacode a Europa para justificar a sua posição esquecendo-se que em assembleias anteriores, o exemplo dado foi a onda de movimentos populares que varre o norte da África derrubando ditadores e que continua, independente da crise européia; para corroborar toda a confusão, as manchetes dos jornais já estavam anunciando o fim da greve desde o dia anterior e a diretoria do Sepe não fez nenhuma declaração a esse respeito. Conclusão a credibilidade do sindicato, solidificada pela greve, rachou perigosamente pela ação irresponsável da diretoria.

Particularmente, considero a postura da direção do SEPE na última assembleia, um fiasco em termos estratégicos, pois depois de anos, sem conseguir uma mobilização de peso da categoria, faltou tato para cuidar do saldo positivo produzido por essa greve, pois a diretoria confirmou as acusações que são feitas ao sindicato e que são de conhecimento de todos, alimentando assim a argumentação dos fura-greves. Pisaram feio na bola, demonstraram uma miopia total em termos de marketing deteriorando a boa imagem sustentada nos 65 dias de greve, que levou a categoria a acreditar na força e no espírito combativo do sindicato. “O SEPE SOMOS NÓS” se tornou uma fala corrente, eivada de orgulho e confiança na boca dos grevistas. O desejo de filiação disparou e agora, tudo isso está ameaçado, agora, pela falta de visão da direção. Esqueceram que a grande maioria que aderiu ao movimento é de calouros e muitos confundem a direção com a instituição sem fazer nenhuma distinção, e essa mancada da atual diretoria se tornou uma ferida, que se não for tratada logo, tende a contaminar a instituição destruindo toda a confiança conquistada e pulverizando a mobilização criada nesta greve.

A participação ostensiva de diversos partidos políticos junto ao sindicato, é uma questão que incomodou e continua a incomodar muita gente, mas a responsabilidade por esse problema é nossa e não da diretoria, fomos nós com a nossa omissão que deixamos o terreno vazio para esses partidos, quem não ocupa perde, essa é a lei. O apoio dos partidos políticos é necessário e bem-vindo , mas não podemos nem devemos deixar que esses partidos usem as nossas assembleias como palanques, ali o espaço é para se tratar da educação e não tribuna para promoção de candidaturas.

Caros colegas que estão se sentindo traídos, envergonhados e desiludidos. Se deixarmos que a emoção nos guiar, vamos jogar no lixo a oportunidade que temos de continuar lutando e de aumentar a nossa força. Não deixe que uma falha humana, destrua a instituição que nos representa.

O SEPE não é da diretoria, não é dos partidos políticos, o SEPE é da categoria! NÓS SOMOS O SEPE, digo e repito com todo orgulho e confiança! Temos que nos filiar em massa e participar da escolha de uma nova direção com representantes que tenha a nossa cara, que defenda os nossos interesses, que tenham sangue novo e não estejam condicionados ás práticas do passado.

O SEPE pode e precisa ser renovado, mas isso só depende de você. Vai desistir ou prefere encarar?

Vamos cuidar das feridas e continuar na luta, a primeira batalha é trabalhar pela filiação em massa da mesma forma com a mesma garra que nos empenhamos em convencer os nossos colegas a aderir ao movimento, pois o sucesso da próxima greve e o seu encaminhamento começa aqui e agora.

fonte: Blog SOS Educação Pública

Nenhum comentário:

Postar um comentário